Isso me interessa!

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Canção para quando João vier....

Era um daqueles dias que chegava ao fim e eu só pensava na minha casa, e dentro dela havia o sorriso mais lindo do mundo, mais encantador, mais contagiante. Dirigi por cerca de 1 hora, normalmente eu faria aquele percurso em 15 minutos, mas devido a engarrafamentos meu tempo se tornou largo, extenso e morria de saudade daquele sorriso, daqueles dentinhos pequeninos e cheios de manhas. Ainda não havia me acostumado passar o dia todo longe dele, 3 anos já haviam se passado, mas mesmo assim todas as manhãs quando ele dizia:
-Tchau mami, bom dia!
Meu coração se derretia, ficava em caquinhos. A verdade é que ele nunca sofreu muito, sempre foi muito auto-suficiente, nas primeiras semanas de trabalho, lembro que ele questionava o porque de eu ter que sair de casa e ele não poder ir comigo, e logo que expliquei a importância de trabalhar para a mami dele, ele assentiu com a cabeça, deu mais um sorriso lindo e disse que ia sentir saudade. 
Assim que estacionei o carro do lado de fora da casa, eu ouvi os latidos dos meus cachorros, logo em seguida os gritos mais estridentes que podem existir.
-maaaaaaaami, maaaaaami chegou, mami chegou....
Corri, o peguei no colo, beijei seu rosto até ele não suportar mais tanto amor e carinho meu. Pediu que o colocasse no chão e fechasse os olhos, que ele tinha uma surpresa para me mostrar:
-mami vem comigo..
Eu fui imaginando milhões de coisas, pois todo dia era a mesma história, ou era um desenho nosso, ou uma arte mais moderna, massinhas coloridas, algo que sempre me enchia de orgulho e de amor.
Quando ele pediu que eu abrisse os olhos, inicialmente eu não entendi, mas ele vendo minha cara de desentendimento pediu-me que olhasse melhor a televisão, se eu não percebia o quanto ela "brilhava", e eu nada.
Até que ele disse com aquele sorriso que me desajustava toda:
-Eu dei banho nela mami, com sabão e tudo, ela está novinha em folha de novo.
Eu entrei em pânico. Nossa televisão de última geração, que só ele usava para ver os desenhos.
- Oh filhote, você lavou mesmo, hein?! Só tem uma coisa que mami precisa explicar para você, a tv não toma banho, quando damos banho nela, ela não liga mais. Vamos combinar uma coisa? Da próxima vez que você for dar banho em alguma coisa, primeiro vai me dizer e eu vou dizer se pode, combinado? Mas nada que liga na tomada toma banho, está bem?
-É mami? que bom, amanhã eu já ia dar banho no computador, não dei hoje porque já estava cansado demais já...

domingo, 26 de maio de 2013

O Brasil esfaqueando a maioridade penal...


A discussão da vez é sobre maioridade penal. Cogita-se a possibilidade, nada remota, de diminuir para 16 anos de idade a maioridade penal. Que mude para 16, 14, 12, 10 anos. Que diferença faz? Para mim não faz nenhuma, porque a discussão não deveria ser essa. Discutir isso é raso, superficial e não resolve de fato o problema que nós temos. Se a decisão de mudar a lei é baseada no fato de ter indivíduos de 16 anos cometendo crimes, não faz diferença aplicar essa mesma lei em outros de 14, 12 e até 10 anos que cometem esses mesmos crimes. E esqueçamos de estatuto da criança e do adolescente, dos direitos humanos, das políticas públicas e da justiça. Justiça? Falar desse nome no Brasil é uma tentativa enfadonha de procurar aquilo que nunca será encontrado.
Por que em vez de diminuir a maioridade penal, o estado não diminui sua hipocrisia, massacre, criminalidade, desonestidade, negligência e crueldade? Porque mudar um artigo na Lei é bem mais fácil. Difícil é mudar a forma como esse país vem sendo construído, difícil é reconhecer que se tem tanto jovem envolvido em criminalidade, minimamente não é porque é gostoso ser bandido, tem algo fora do lugar nessa questão e que eles deveriam buscar as respostas, nos dar respostas. Besteira minha, não é? O país precisa existir, precisa existir culpados, inocentes, bem, mal e uma comodidade mórbida. Besteira minha achar que pode haver coerência entre vantagens e necessidades.
Há ainda outro fator muito relevante. Nós sabemos que nossa sistema penitenciário forma mestres e doutores em bandidagem, em falta de humanidade. Um jovem que entra para a cadeia porque colocou uma faca no pescoço de alguém em um assalto para sustentar seu crack, sai dela esfaqueando tudo e todos. Esfaqueia a justiça, a ética, as pessoas, mas antes foi esfaqueado pela sociedade, pelo sistema, pelo estado. Não tenho interesse em defender jovens criminosos, mas antes de tomar qualquer decisão que implique numa mudança tão crucial, quero pensar nas consequências que isso poderá nos trazer. Eu falo "nos" por afetar diretamente a mim. 
Se vivêssemos em um país onde educação, saúde e segurança fossem prioridade talvez agora não tivéssemos o trabalho de mudar o numerosinho 18 para 16. Mas colocar uma venda nos olhos e um sorriso no rosto sempre foi o caminho percorrido por quem acredita que justiça se constrói da noite para o dia.
Enfim, caso essa nova constituição entre em vigor, para quem ela terá valor mesmo, hein? É bom pensar...

domingo, 19 de maio de 2013

Eu não sei ser mulher....



Venho me surpreendendo com a forma de como as mulheres, fictícias ou não, que eu tenho entrado em contato, tem despertado em mim uma insatisfação agonizante. Esse sábado eu assisti Thérèse, um filme que conta a história de uma mulher que tem sua vida toda permeada por determinismos, desde antes de vir ao mundo e até que se parta dele. 
Acho os filmes franceses sombrios por natureza, é uma característica muito deles. A frieza e a secura que é tão peculiar, as vezes contrasta de forma comovente com nossa cultura, nosso jeito. Óbvio que também não quero ser determinista e dizer que eles só produzem filmes assim, mas normalmente é, basicamente, o que chega para nós, é o que temos acesso. 
Thérèse é uma mulher que vive para pensar, e em seus pensamentos há grande oposição à sua realidade, não aceita, mas também não vê muita saída, logo vê o casamento como forma de se salvar, única forma, além de aumentar a propriedade de sua família e da família de seu futuro marido, já que ambos são vizinhos e juntos poderão tornar-se mais fortes politicamente e socialmente. A ideia de um casamento com amor não existe. Existe uma necessidade de justificar a vida que levam, maior do que eles mesmos . 
Ao casar-se com Bernard, Thérèse descobre que o que sente não pode ser salvo, nem pela ideia de vida à dois, ganhos financeiros, tampouco pela filha que geriu. Um dos fatos que me chamou atenção foi a falta de passionalidade com relação a sua filha, em todo filme você não percebe uma troca afetiva entre elas. Ela a pariu porque era imprescindível, as mulheres casam para parir, não importa qual a sua vontade, naquela época, quantos mais filhos, melhor, se fosse um varão então, perfeito. Thérèse não consegue viver a vida que quer e nem a vida que determinaram para ela, sua feição sombria e carregada de um fardo estertorante nos faz comungar, enquanto mulheres, com a dura vida que só cabe a nós vivermos. Ser mulher é muito complexo, viver isso de forma coerente creio que é quase impossível. 
O filme, apesar de simples, me fez absorver todos os desmembramentos, que a sociedade impõe, de acordo com seu interesse.  Percebi que ao sair do cinema eu tinha muito de Thérèse em mim, acredito que até meu caminhar estava parecido com o dela. Caminhei por mais de uma hora, da Carlos Gomes até a Sete Portas, e de fato não queria estabelecer contato com mais ninguém, quase que nem respondia aos chamados eloquentes dos vendedores na Barroquinha, eu não queria perder o contato que tinha estabelecido comigo  através de Thérèse. Creio que já me tiraram coisas demais na vida pelo fato de ser mulher, não queria que me roubassem aquela reconexão comigo, por mais dolorosa que tenha sido. Eu ignorei os olhares que eram dirigidos para a moça de vestido longo floral Frida Kahlo e casaco amarelo. O que era primaveril por fora, era inverno congelante por dentro. A sensação de não conseguir ser o que desejo doeu tanto que chorei. E ainda choro, por mais que as lágrimas já tenham cessado. E Thérése, ainda que seja "friamente" francesa, comunga do mesmo sentimento de determinismo que só o mulheril, em qualquer parte do mundo, pode sentir. Eu, costumeiramente ensolarada, fui friamente francesa hoje!

domingo, 12 de maio de 2013

Poeticamente, eu também me encontrei, Elena!





Há algumas semanas eu tenho visto o trailer do filme brasileiro Elena. Ficava encantada com o texto, com a história e possível desfecho, ficava imaginando o que tinha acontecido com Elena, mas surpresa maior me causou perceber o que Elena fez comigo, de repente estava diante da tela do cinema extasiada com tanta beleza, doçura e poesia.  Elena é um documentário poético, artístico e vivo. É real. É inspirador. 
O enredo conta a história de uma menina que sonha viver de arte, que se não for para ser assim, prefere morrer. Ela, ainda jovem, decide ir para Nova York porque quer fazer cinema, volta meses depois, recebe uma carta de aceite para uma universidade americana e retorna, mas dessa vez com a mãe e sua irmãzinha, Petra. Petra Costa, que decide percorrer os seus passos, em todos os sentidos. Ela vira atriz e vai para Nova York, mesmo sua mãe dizendo que essas eram as únicas coisas que ela não poderia fazer na vida. Mas ela fez, ainda bem que ela fez!
Acredito que poucos, assim como dizia Diego Rivera com relação a Frida, tenham conseguido colocar tanta amargura poética numa tela, mas nesse caso numa tela de cinema. Petra conseguiu. De alguma maneira, o sentimento de Elena é compartilhado com nossa eterna dúvida do que é a vida. Ela nos convence de que se a vida não vale a pena, temos que morrer junto com ela, mas ironicamente, o documentário mostra o quão viver vale a pena, especialmente para apreciar a arte. No filme, Petra morre hipoteticamente  para ressurgir, re-significar sua existência, e ela consegue nos re-significar com sua poesia, com o tom doce de sua voz ao delatar cada passo transcorrido por Elena, existe poesia em tudo. E assim como Elena, que mesmo distante vira água, se desfazendo em gotas, desaparecendo, nós esboçamos no sorriso o refazimento do sentido da arte, da vida. É porque em algum momento arte e vida se confundem, você não consegue mais perceber a diferença entre uma coisa e outra.
A partir do momento que eu te conheci, Elena, eu me encontrei, poeticamente!


segunda-feira, 6 de maio de 2013

Hoje eu senti inveja de Paris....


Está ocorrendo essa semana o Festival Varilux de Cinema Francês. Passei meus últimos três anos meio apática com relação a cultura francesa, na verdade tenho desmistificado aquela ideia que tinha na minha adolescência sobre os clássicos literários franceses, não que eles não sejam bons, são maravilhosos, mas de certo modo foi minha referência literária por muitos anos, sendo que eu podia ter tido muitas outras. Vi hoje o filme Uma dama em Paris de Ilmar Raag. O gênero é dramático, mas é permeado por um estilo jocoso que nos entretém e nos arranca gargalhadas em vários momentos. 
O enredo conta a história de Anne que vive na Estônia e está em um momento doloroso por conta da perda  da mãe, mas algo inesperado acontece, ela recebe uma proposta de trabalho: ir viver em Paris e cuidar de uma senhora idosa que possui a mesma origem que a sua. No entanto as coisas não funcionam de forma simples, pois Frida, a senhora que necessita cuidados, é uma mulher que vive só e cheia de amargor, por isso tenta de todas as formas dispensar Anne, a qual não foi contratada por ela, mas pelo seu ex-amante. A história é singela, todavia me chamou atenção os passeios tranquilos que Anne faz na noite parisiense, coisa impensada para a noite soteropolitana. Isso me fez refletir bastante por ser uma pessoa extremamente noturna, por ter desejos desmedidos em andar pela noite afora sem me preocupar com violência e violação. Sonho um dia poder sair pela cidade olhando vitrines e monumentos que são modificados pela noite, pela quase ausência de barulho e de pessoas, situação que eu vi o tempo todo no filme, apesar de não acreditar que Paris seja a descrição de Dumas, Verne e Hugo que tanto li na minha adolescência e revivi hoje em Uma dama em Paris. 
Ao sair do Cinema do Museu, no Corredor da Vitória, foi acometida por uma realidade de flanelinhas sedentos e ávidos meninos de rua que me entristeceu e me atormentou  Nos ensinaram a vida toda que o estilo de vida parisiense deveria ser seguido e admirado, mas não nos ensinaram a reconhecer nossa cultura e mudá-la de acordo com nossas necessidades e desejos desmedidos, fomos ensinados somente a aceitá-los.
Essa sensação de não poder andar livremente pela rua me fez refletir também sobre questões de gênero, não que só as mulheres sejam as únicas vítimas de violência, os homens também são, mas nós mulheres estamos sujeitas às situações que os homens normalmente não estão, e isso me atemoriza desmedidamente. 
Depois de caminhar assustada pela rua deserta por 10 minutos, comecei a pensar na maldade que um homem pode me causar. Cheguei ao ponto de ônibus e encontrei um ex-colega de trabalho que não o via fazia algum tempo, nunca fomos próximos, afinal fiquei na empresa menos de um mês, mas sempre que o encontro sou educada. Assim que me viu veio falar comigo efusivamente, coisa que nunca aconteceu antes, aquilo me assustou, logo percebi pelo cheiro e pela forma como me olhava e falava comigo que estava meio embriagado, fiquei constrangida, não que ele tenha me destratado ou falado algo obsceno, mas o jeito como me olhava e pegava no meu braço me deixou extremamente incomodada. Odeio que me peguem, me toquem, sem que haja correspondência ou intimidade.  Sei que o fato de eu ser mulher e ele ser homem o fez presumir que eu estava disponível, mas não estava, me nego a estar para esse tipo de homem!

quarta-feira, 1 de maio de 2013

Hoje eu comi infância...



Hoje eu comi minha infância, é verdade, eu a comi, com toda vontade. Lembro que quando era criança minha mãe fazia os famosos bolinhos de chuva, era uma refeição quase diária nos nossos cafés da manhã, às vezes a única. Eu faço bolinhos de chuva, dizem que até cozinho bem, mas eu nunca consegui e jamais vou conseguir fazer os bolinhos de chuva e o café preto que ela fazia naquela época, que ela ainda faz. Ela os fazia porque de certa forma a farinha de trigo e ovos eram mais baratos e éramos uma família grande e faminta. Fazia também cuscuz e beiju  em dias alternados, claro, não tinha condições de fazer um rico café da manhã, aliás a comida era regrada por demasio, era cerca de 5 a 7 bolinhos de chuva para cada um, isso não era imposto, mas já cumpríamos esse ritual porque no fundo, apesar de todos os conflitos, não queríamos ver nenhum dos irmãos com fome. Houve épocas que cheguei a odiar bolinhos de chuva, isso porque era a única menina e por mais que fosse ousada e vivesse sob uma educação matriarcal, a meus irmãos eram poupados depois de certa idade os serviços domésticos. Lembro-me bem que minha mãe acordada às 6:00h e antes de sair para trabalhar, fazia a massa em um prato marrom duralex, fritava os sete que ia comer, fazia o café e deixava o restante da massa para que eu fritasse assim que acordasse, pois era a mocinha que tinha que fazer, as vezes meu sono e a fome dos meus irmãos falavam mais alto, então eles mesmos fritavam, lógico, cada um fritava seus sete bolinhos, quando eu acordava fritava o resto da massa ou fritava tudo. Pois bem, aquilo que há algum tempo foi martírio, hoje eu como com saudade e desejo, hoje eu como infância!